sábado, 22 de novembro de 2008

[Rec]


Romero + A Bruxa de Blair

Desde que George A. Romero criou o chamado “filme de zumbis”, ao longo dos anos acompanhamos várias e várias novas versões da temática nas telas de cinema. O próprio Romero retomou o mote em diversas oportunidades, além de outros diretores, sempre procurando colocar em seus longas um contexto de acentuada crítica social. [Rec], longa espanhol atualmente em exibição nos cinemas brasileiros, se apresenta como mais um dos herdeiros desta tradição, muito embora não se possa designar exatamente suas ameaças como “zumbis”.

Seus humanos-monstros lembram muito aqueles de “Extermínio”, produção inglesa dirigida por Danny Boyle que se tornou cult (e também mais um dos herdeiros da tradição dos filmes de zumbi). Trata-se de uma variação moderna, em que pessoas são transformadas em monstros devido a vírus, bactérias ou outras espécies de microorganismos alterados em laboratório. Outro aspecto bem presente nos filmes do gênero que também se faz presente neste é o clima claustrofóbico, de confinamento. Quase toda a ação se passa dentro de um edifício residencial, assim como em “Madrugada do Mortos”, de Zack Snyder, quase tudo acontece dentro de um shopping center. Interessante notar que [Rec] também se mostra sucessor do gênero “realidade”, o qual teve em “A Bruxa de Blair” um de seus precursores (e recentemente representado por “Cloverfield”). Afinal, [Rec] mostra a gravação de um programa de TV chamado “Enquanto Você Dorme”, onde sua apresentadora, Ângela Vidal (Manuela Velasco, gatinha espanhola), mostra o trabalho daqueles que varam as madrugadas, tal como sugere o título. Acompanhada do cinegrafista Pablo (o próprio diretor de fotografia Pablo Rosso, que nunca aparece em cena), ela acompanha o corpo de bombeiros em uma chamada durante a madrugada. Em um condomínio residencial, uma senhora idosa está causando pânico entre os vizinhos com seus gritos assustadores. O que parecia uma ocorrência fácil, apenas uma mulher com desequilíbrio mental, vai se transformando, aos poucos, em uma situação escabrosa, a qual colocará em risco a vida de todos os presentes no edifício.

Esse estilo “realidade” é sempre uma via de mão dupla. Se, por um lado, acaba passando ao espectador a sensação de que aqueles fatos estão realmente acontecendo, por outro necessita eliminar certos elementos cinematográficos que podem ser muito úteis na construção de um clima macabro ou de suspense. O mais notável destes ingredientes extirpados é a trilha sonora. Ultimamente este importante recurso vem sendo utilizado de forma sofrível pelas produções de terror. Os diretores do gênero possuem uma tendência à histeria, colocando o volume no máximo, no rumo “quanto mais invasiva a trilha melhor”. Contudo, se bem utilizada, a trilha pode ser um ótimo elemento para compor a tensão, como bem mostrava o mestre Alfred Hitchcock em suas inesquecíveis obras (alguém é capaz de imaginar a famosa cena do chuveiro em “Psicose” sem a sua famosíssima trilha?). O resultado naturalístico obtido pelo estilo “Bruxa de Blair” de filmar soa sempre, pelo menos para mim, um tanto “meio-termo”: falta alguma coisa.

Outra característica marcante do dito estilo deixa sua marca em “[Rec]”. Como era de se esperar, a câmera trêmula na mão percorre toda a projeção e talvez seja o melhor do longa. A câmera, não é exagero afirmar, torna-se o principal personagem de toda a narrativa, da qual só vemos os acontecimentos enquanto o aparelho de Pablo está ligado. E isso é algo que realmente valoriza este produto. Quem costuma ler minhas resenhas já deve saber o quanto eu admiro o que se pode chamar de “cinema total”, ou seja, o cinema que utiliza a imagem como base para todo o desenvolvimento da ação, relegando o texto a um plano menor. Cinema é imagem e, mais uma vez repito, costumo me irritar com diretores que confundem a arte cinematográfica com o teatro (há grandes filmes “teatrais”, mas isso não significa que devamos aceitá-los como regra). E, no presente caso, os diretores Paco Plaza e Jaume Balagueró foram muito felizes em fazer da imagem o principal elemento de sua narrativa. E eles também não esqueceram de incluir bons momentos de crítica social, fazendo lembrar os longas de Romero.

Com relação às atuações,vale dizer que Manuela Velasco se mostrou bastante convincente no papel, muito embora não se possa afirmar se ela está interpretando ou apenas representando a si mesma (ela é estrela na TV espanhola). Os demais não têm muito a fazer, a não ser Pablo, o câmera-man, do qual, como já mencionado, só ouvimos a sua voz.

É certo que o filme fez muito sucesso na Espanha, tanto que Hollywood (como sempre) já comprou a idéia e levou adiante sua adaptação, que deve estrear em breve em terras tupiniquins com o nome “Quarentena”. Mas, fico com a minha afirmação mais acima: o terror-suspense-realidade gera sempre a impressão de que algo está faltando. Esperava levar mais sustos...

Obs. Não é que em alguns momentos o filme me lembrou “Ensaio Sobre a Cegueira”? Imagino que os mais atentos vão perceber o porquê.

Cotação: *** (três estrelas)
Nota: 7,5



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