quarta-feira, 1 de maio de 2013

Filmes Para Ver Antes de Morrer

A Noviça Rebelde
(The Sound Of Music, 1965)


Alegre como o ano novo


Eu nunca fui muito adepto de festas de réveillon. Sempre considerei uma celebração meio sem sentido. Afinal, não é porque o planeta Terra iniciará mais uma volta em torno do Sol que a vida de ninguém vaia mudar. Nós é que devemos fazer com que as coisas mudem e não ficar esperando transformações devido a uma alteração no calendário. Sendo assim, costumo passar as entradas de ano em família, se não na minha própria, casa passo em casa de parentes. Nada de badalações em praias, bares, clubes etc. O fato de passar os réveillons próximo a uma televisão sempre me possibilitou verificar quais os primeiros filmes exibidos pelas emissoras em cada ano (tudo bem, realmente acho que isso é coisa de cinéfilo maluco). Há algum tempo, a Globo costumava exibir como primeiro filme do ano um clássico absoluto entre os musicais, o qual, com sua sequência de abertura característica, era de fácil identificação. Tratava-se da tomada aérea que mostrava as belas montanhas da Áustria em um longo plano-sequência que culminava com a aparição de Julie Andrews cantando “The Sound Of Music”. Sim, você já deve ter percebido qual o filme em questão. Trata-se de “A Noviça Rebelde”, um dos mais populares musicais de todos os tempos.

Dizer que este longa-metragem é um dos musicais mais populares já realizados não é uma hipérbole. Ele é o terceiro filme com maior número de ingressos vendidos, ficando atrás apenas de “...E o Vento Levou” (Gone With The Wind, 1939) e “Star Wars – Episódio IV” (1977). Em valores corrigidos, sua arrecadação atingiu quase US$ 1 bilhão apenas nos Estados Unidos. Estima-se que mais de um bilhão de pessoas ao redor do globo já viram a história da família Von Trapp levada à tela grande em 1965 por Robert Wise, um cineasta normalmente relegado ao segundo plano pela crítica, mas que aos poucos vem tendo sua reputação devidamente restabelecida. Apesar de não ser exatamente sua especialidade, Wise foi responsável por dois musicais de extrema importância no cinema hollywoodiano. Antes de “A Noviça Rebelde”, dirigiu em 1961, ao lado de Jerome Robbins, “Amor, Sublime Amor” (West Side Story), outro exemplar do mais autêntico musical representativo do antigo studio system. É possível, inclusive, enxergar “A Noviça Rebelde” como o canto do cisne dessa “era de ouro” do gênero. Lembre-se que o cinema norte-americano estava às vésperas de uma revolução que mais tarde seria conhecida como “Nova Hollywood”.



Wise não só foi o diretor do longa-metragem, mas também o seu produtor, o que lhe garantiu total controle sobre o projeto, uma adaptação para a tela grande de um musical da Broadway, cuja trama se baseia na história real da família de cantores Von Trapp. Ou seja, como acontece com frequência no gênero musical (a exemplo do citado “West Side Story”), temos aqui uma adaptação da adaptação. Torna-se importante ressaltar que a história a ser contada é a da família, pois o título em português pode levar muitos a imaginarem que o foco da narrativa é a noviça Maria (Julie Andrews). Ela realmente possui um papel predominante na primeira metade da trama, (com roteiro de Ernest Lehman) centrada na maneira como se desenvolveu o romance entre a espevitada noviça e o Capitão Georg Von Trapp (interpretado por Christopher Plummer), um viúvo pai de sete filhos que controla com regras militares. Maria, que não consegue se adequar à rigidez do convento (1), vai trabalhar como governanta no casarão da família e as crianças, inicialmente resistentes (como sucedia com todas as governantas), vão se afeiçoando e se encantando com seu jeito alegre e amoroso. Ela e o capitão acabam se apaixonando e ele desfaz o noivado com uma rica baronesa (Eleanor Parker) para se casar com Maria. Já na segunda metade da projeção, vemos a invasão nazista em território austríaco e a recusa do Capitão em colaborar, dado o seu perfil antinazista. A família então se vê forçada a fugir para outro país, atravessando a pé a fronteira com a Suíça (na história real, posteriormente eles emigrariam para os EUA).

Opa, sei que acabei contando toda a história do longa. Spoiler gigante? Pode ser, mas, sinceramente, o encanto da película não está exatamente na história narrada, de resto já bastante conhecida, mas na forma como ela é contada, repleta da magia que só os grandes musicais sabem proporcionar. O poder das canções concebidas pela famosa dupla de compositores Richard Rodgers e Oscar Hammerstein II é atemporal, ainda mais quando interpretadas por uma Julie Andrews em estado de graça e um sensacional elenco infantil de crianças bonitinhas e carismáticas. Christopher Plummer está divertidíssimo como o patriarca Von Trapp (e olha que o primeiro a ser cogitado para o papel foi Yul Brynner) e todo elenco de apoio também se encontra especialmente inspirado, vide as ótimas participações de Richard Haydn como o impagável Tio Max e Eleanor Parker como a Baronesa Elsa. Mas não é só o elenco e as músicas que impressionam em “The Sound Of Music”. A sua mise-en-scène é admirável, com um direção de arte soberba e uma fotografia inesquecível (de Ted McCord), vide a mencionada cena de abertura, de beleza ímpar, que foi filmada seis vezes a partir de um helicóptero. No mesmo nível de qualidade encontra-se a edição, a qual imprime um ritmo perfeito para uma produção com 174 minutos.


Vencedor de 5 Oscars (melhor filme, diretor, edição, som e trilha sonora), “A Noviça Rebelde” é um verdadeiro espetáculo tanto para os olhos quanto para os ouvidos e o fato de ser um filme tão querido até hoje é o maior indício de sua excelência. O American Film Institute o coloca, merecidamente, entre os cinco melhores musicais estadunidenses de todos os tempos. Ao revê-lo recentemente, entendi o porquê de sua exibição constante em viradas de ano. Além de sua alegria latente, é uma obra que exala otimismo. O final, com a família Von Trapp atravessando a pé a fronteira com a Suíça, através dos Alpes, enaltece de forma emotiva e eficiente a força dos laços familiares e de solidariedade, valores estes lembrados coletivamente nas festas de fim de ano. Sendo sincero: para um cinéfilo, assistir a “The Sound Of Music” pode ser bem mais interessante e recompensador do que certas festas de réveillon. Ah, e não estranhe se depois de vê-lo as suas canções permanecerem pegajosamente na sua memória. Comigo aconteceu a mesma coisa...


Cotação:



Nota: 10,0


(1) Segundo informação que consta da edição brasileira em blu-ray, a própria Maria afirmava que sua indisciplina no convento era bem maior do que a mostrada no filme.
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2 comentários:

Hugo disse...

Mesmo não sendo grande fã de musicais, considero este filme obrigatório para os cinéfilos.

Abraço

Jefferson C. Vendrame disse...

Mais uma vez, um grande texto Fábio!
Apesar de considerar AMOR SUBLIME AMOR bem melhor, também gosto muito de A Noviça Rebelde, que sem dúvidas é um dos maiores musicais de Hollywood. Esse ano, achei muito interessante ver Christopher Plummer no Oscar, como nostálgico, achei o momento um dos melhores da cerimônia.

Grande Abraço!